16 dezembro 2011

Beleza Adormecida

A beleza efêmera, a vida esgotada, por lentes frias e vazias

#cinema
 

Em 1975, o diretor italiano Pier Paolo Pasolini lançou o controverso "Saló ou os 120 Dias de Sodoma". Passado na Itália de 1944, conta a sádica história de um grupo de jovens sequestrados e torturados física e sexualmente por fascistas.

No lindo casarão onde os jovens são mantidos, com histórias eróticas contadas por damas em luxuosos vestidos e imagens de perturbadoras práticas sexuais, Pasolini escancara os desejos mais obscuros e perversos do imaginário humano.

Em 2011, a novelista Julia Leigh, apadrinhada de Jane Campion (a única mulher da história a ganhar uma Palma de Ouro), fez sua estreia como diretora no Festival de Cannes com o não menos controverso e intrigante "Beleza Adormecida" - que de contos de fada, não tem nada.

Leigh faz de sua princesa seu próprio "Saló", e referências à Pasolini são invocadas em diversos momentos - desde a mansão onde tudo ocorre até os figurinos e poses feitas pelas atrizes. Mas, enquanto o italiano preocupava-se em mostrar os mais pútridos desejos, a australiana submete sua personagem ao limite, não para auto-satisfação, mas por uma questão de sobrevivência.

Lucy é uma universitária que passa por problemas financeiros. Já com dois empregos, ela recorre, usualmente, à prostituição. Logo, com o agravamento de sua situação, ela procura um novo ramo da prostituição de luxo, no qual ela é sedada e permanece inconsciente durante a noite com seu parceiro - daí, o trocadilho com o clássico infantil.


Filmando planos centralizados e até simétricos, com a câmera na maior parte do tempo fixa, Leigh constrói intermináveis sequências, tudo de um modo onipresente e distante. A frieza do roteiro e o inacessível personagem de Emily Browning, numa atuação branquíssima, apenas contribuem com a indiferença do longa. E o que temos é um filme desconcertante e, visualmente, muito belo.

O drama é uma grande metáfora sobre a beleza e a vida: ao mesmo tempo que os homens que pagam Lucy enfrentam seus dilemas com a idade não deixando ninguém (nem mesmo sua parceira) veja sua velhice, a própria universitária sabe que não poderá viver de seu trabalho para sempre, e que sua beleza, por mais rara e preciosa que seja, um dia esgotará.

Está certo que os diálogos dispersivos e muitas vezes incompreensíveis diluem o impacto da obra, mas Leigh conduz sua personagem exaustivamente e, por mais distante seja, sentimos seu sofrimento mais profundo. Enquanto em "Saló" o sexo era representado como forma de puro e leviano divertimento, em "Beleza Adormecida" a vida é um beco sem saída.



Beleza Adormecida (Sleeping Beauty), 2011
Direção: Julia Leigh
Roteiro: Julia Leigh
Gênero: Drama
Origem: Austrália
Duração: 102 minutos
Elenco: Emily Browning, Rachael Blake, Michael Dorman, Mirrah Foulkes, Hugh Keays-Byrne, Chris Haywood, Tammy McIntosh, Joel Tobeck, Henry Nixon

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